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18.10.08

Antes do fim do dia


















Precisava urgente marcar hora no oculista. Não conseguia ler direito o destino dos ônibus, a não ser quando já estavam muito perto. Mas cadê tempo? Tanta coisa pra fazer, tudo de uma vez. Olhava no relógio a cada segundo. Depois firmava a vista no trânsito. Lá adiante outro coletivo. Pra onde será que ele vai? Um vulto apenas, se aproximando, veloz e tortamente do ponto. Esse não serve. Os de tom azulado eram intermunicipais. Os urbanos tinham todos a mesma cor predominante. Ah, meu Deus! Que demora! Lá adiante mais outro, e era de admirar com que convicção as pessoas no ponto estendiam o braço, mesmo a grande distância.

Tanto por fazer, e nada do 612A. Olhava o relógio. Precisava visitar tia Joaninha, coitada, tão velhinha e entrevada. Precisava jogar um real na mega-sena acumulada. Então teria tempo e dinheiro de sobra pra consultar o melhor oculista, além de muito menos por fazer o dia inteiro. Só no bem bom. Precisava de um aumento. Depois de tantos anos, e ninguém reconhecia. A moça estendeu a mão. O ônibus bufou e parou a centímetros de seu nariz. A moça embarcou. Conhecia aquela moça! Não era a mesma que todo dia pegava a condução naquele horário? Lá se foi o 612A, todo torto e barulhento. Não teve tempo de embarcar. Precisava antecipar a visita ao oculista. Depois iria ver tia Joaninha. Já tão velha e entrevada, coitada...

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Publicado em "Trilogia Paciente"
Casa do Novo Autor & Editora (SP - 2000)
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